Durante minha formação em Arquitetura e Urbanismo, um questionamento persistente se instalou: como cidades europeias, remodeladas ainda no século XIX — como Paris, com o Plano Haussmann, ou Barcelona, com o plano Cerdà — conseguem manter edificações dessa época em pleno uso até os dias de hoje? Observa-se, por exemplo, que a morfologia e o gabarito arquitetônico de Paris continuam a compor sua paisagem urbana com forte identidade visual e funcionalidade contemporânea.
Enquanto isso, o cenário de cidades brasileiras como Belo Horizonte é bem diferente. O centro da capital mineira encontra-se marcado por edifícios verticais obsoletos, muitos deles fechados e sem perspectivas de reocupação. A dinâmica de substituição predial em curso, que consiste na demolição para construção de novas torres, apresenta um alto custo ambiental: gera resíduos de construção e demolição e consome grandes quantidades de recursos naturais e energia.
Diante desse panorama, surge uma alternativa promissora: reformar, renovar, reabilitar, requalificar, restaurar — ações que se reúnem sob o conceito técnico e mercadológico do retrofit. Este termo é utilizado para designar projetos que modernizam edificações existentes, respeitando suas estruturas originais, mas atualizando seus sistemas e adequando-os às normas técnicas e demandas contemporâneas.

O retrofit pode incluir a revitalização de fachadas, a melhoria da ventilação e da iluminação natural, a atualização das circulações verticais e horizontais, bem como a mudança de uso — como a conversão de prédios comerciais subutilizados em residenciais ou de uso misto. Essa estratégia permite dar novo valor a imóveis com localização privilegiada, promovendo ao mesmo tempo preservação urbana, reocupação de áreas centrais e desenvolvimento sustentável.
Enquanto cidades como São Paulo e Rio de Janeiro já contam com experiências consolidadas em retrofit, Belo Horizonte começa a avançar nessa direção. A prefeitura incorporou a estratégia ao Programa de Requalificação do Centro – “Centro de Todo Mundo”, que visa promover uma ocupação mais equilibrada e funcional da região central, incentivando moradia, comércio e lazer.
Entre as medidas implementadas estão:
Iniciativas como a revitalização do Mercado Novo e o fortalecimento do polo gastronômico da Rua Sapucaí demonstram o potencial da região central de BH para atrair investimento e gerar novas centralidades culturais e econômicas.
Dois exemplos emblemáticos dessa transformação urbana em Belo Horizonte são o Hotel Tribe Liberdade e o Edifício Excelsior. O primeiro, anteriormente fechado e em estado de abandono desde 2013, está sendo transformado em um hotel contemporâneo, com projeto do OR3 Grupo. Já o segundo, convertido em 2004 de hotel para edifício residencial multifamiliar, representa um marco local na reconversão de usos.

Essas intervenções apontam caminhos viáveis para o reaproveitamento do patrimônio edificado, contribuindo para reduzir a pressão por novas construções e revitalizar áreas urbanas degradadas.
O retrofit surge como uma solução tecnicamente viável, ambientalmente responsável e economicamente atrativa para os desafios contemporâneos das cidades brasileiras. Ele não apenas preserva a memória e a identidade urbana, mas também reduz o impacto ambiental do ciclo construtivo tradicional e potencializa a qualidade de vida nos centros urbanos.
Na Ecominas, acreditamos que repensar a forma como ocupamos e transformamos nossas cidades é essencial para um futuro mais sustentável. Trabalhamos ativamente para que Belo Horizonte se torne uma cidade mais viva, habitável e regenerativa — e torcemos para que essa ideia se consolide e inspire outras iniciativas pelo Brasil.